Vale Tudo 2025: primeiras semanas mostram remake ousado, mas com menos densidade que o original
Introdução: O peso da tradição
A Globo celebra seus 60 anos com uma novela arrasa-quarteirão: Vale Tudo. O título não é só uma escolha simbólica — é o epítome do que muitos consideram “a novela das novelas”. A versão original, exibida entre 1988 e 1989, nasceu num Brasil mergulhado em crises políticas, inflação galopante e uma república em mutação. Era uma novela com cheiro de realidade, com cara de povo, e alma crítica. Um espírito de seu tempo.
Agora, em 2025, a emissora tenta atualizar esse clássico com um remake que respeita o original, mas também quer pisar firme no presente. E aí a pergunta inevitável: vai conseguir?
O legado complicado de “Mania de Você”
Antes de entrarmos em Vale Tudo, não dá pra ignorar a sombra que paira sobre ela: Mania de Você. A novela anterior do horário nobre — uma promessa de virada constante, ação e emoção — virou um caldeirão de frustrações. E eu, como telespectador dedicado, acompanhei.
A primeira fase de Mania de Você até que foi boa. Angra dos Reis virou palco de dramas intensos entre Mavi, Luma, Viola e Rudá. A trama tinha fôlego. A promessa de JEC (João Emanuel Carneiro, o nosso JEC) era ousada: “o jogo vira o tempo todo”. Mas quando veio a passagem de 10 anos na história, foi o público quem virou as costas.
Eu não consegui continuar assistindo. Ver Luma (vivida por Agatha Moreira) sendo passada pra trás, perdendo tudo, virando motorista de aplicativo e engolindo sapos sem nem registrar um BO… era demais. Luma era uma chefe formada na França, poxa! E a cereja do bolo foi quando percebi que aquilo não fazia mais sentido. Larguei antes mesmo do tal baile de máscaras.
Primeiras impressões do novo Vale Tudo
Duas semanas de exibição e já deu pra entender que Vale Tudo versão 2025 é um universo paralelo. Sim, a trama bebe na fonte da original, mas não se limita a copiar. E você nem precisa ter assistido à primeira exibição nos anos 80 pra comparar — ela tá lá no Globoplay, prontinha pra ser revisitada.
A verdade é que o texto original segue imbatível. A qualidade da imagem pode até acusar o tempo, mas os diálogos, os personagens, a construção de mundo… tudo ali pulsa vida. Do mordomo cinéfilo dos Roitmans à Maria de Fátima com sua aura de ambição escancarada — todos tinham nuances, motivações, complexidade.

O toque de Manuela Dias e os dilemas da adaptação
Na versão escrita por Manuela Dias, dá pra notar claramente as digitais da autora: os diálogos mais objetivos, o comportamento dos personagens ajustado ao politicamente correto, e um olhar que tenta atualizar a história sem desagradar. Mas essa tentativa talvez esteja achatando o que era tridimensional.
Com menos capítulos que a original, tudo parece mais apressado — e mais raso. A nova Maria de Fátima (interpretada por Bella Campos) virou influenciadora digital, mas perdeu algo no processo. A personagem que antes era maquiavélica, inteligente, cheia de camadas, agora soa unidimensional. E isso não é culpa do elenco. Taís Araújo como Raquel Acioli entrega força e dignidade, mas o texto… carece de densidade.
Manuela Dias parece ter passado a faca num roteiro antes robusto, deixando ele anêmico em camadas sociais e filosóficas. A trama mãe e filha está ali, mas e o questionamento central da novela? Cadê o famoso dilema: “vale a pena ser honesto no Brasil?” Ele ficou nas entrelinhas, ou foi deixado de lado?
Talvez isso mude. Talvez essa “bandeira vermelha” que se levantou no fim da segunda semana seja apenas um desvio de rota, e o conteúdo denso e provocador retorne nas próximas semanas. Torço pra que sim — porque Vale Tudo não é só novela, é patrimônio.
Conclusão: expectativa e observação
A missão de um remake é ingrata: agradar novos públicos e honrar memórias antigas. Mas até agora, Vale Tudo está caminhando com cuidado, tentando equilibrar fidelidade e ousadia. Fica aqui meu olhar atento e crítico, mas também esperançoso. O Drollverso seguirá acompanhando capítulo a capítulo esse embate entre passado e presente, torcendo pra que a novela reencontre sua essência — e nos faça, mais uma vez, debater à mesa se ainda vale a pena ser honesto nesse país.

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